terça-feira, 12 de agosto de 2008

PAIXÃO E MORTE DA PRINCESA D. ISABEL A REDENTORA

Paixão e Morte da Princesa D. Isabel,
A Redentora
Otto de Alencar de Sá-Pereira


Muitos a tratam de D. Isabel I, a Redentora. Por que? Porque ela, de fato, ocupou a Chefia do Estado, reinou, como Regente do Império, por três ocasiões, nas viagens ao exterior de seu augusto Pai, D. Pedro II. Somando-se o tempo destas três regências, eqüivale, mais ou menos, a um quadriênio republicano. Além disso, ela foi nossa Imperatriz, no exílio, desde a morte de D. Pedro II em 1891, em Paris, até seu próprio passamento, em 1922, no Castelo d’Eu. Sim, ela foi nossa Imperatriz no exílio, “de jure” (de direito), uma vez que, a república, no Brasil, foi imposta por um golpe militar, que não consultou a Nação. Aliás, é o próprio primeiro decreto republicano, que institui as novas Forma e Sistema de Governo (República-Presidencialista) que o confessa, pois esta Lei (decreto nº 1 da República), declara “Proclamada provisoriamente, a República no Brasil, até sua confirmação, por “referendum popular”, e ainda diz, “como deve ser”. Ora, este “referendum” nunca aconteceu, portanto a República permaneceu provisória. É verdade, que, em 1993, graças ao Deputado Cunha Bueno, houve um Plebiscito, para o Povo escolher entre as Formas de Governo – Monarquia ou República – e entre os Sistemas – Presidencialismo ou Parlamentarismo. E a República Presidencialista saiu vitoriosa. Entretanto este Plebiscito ocorreu 104 anos depois da pseudo proclamação da República, logo, na melhor das hipóteses, a república ficou provisória por 104 anos. Por que, na melhor das hipóteses? Porque este Plebiscito de 1993 pode ser considerado inválido, por inúmeras razões, que não cabem ser explicadas neste artigo (a propósito, leia-se o livro “Diálogos monárquicos” de nossa autoria).
A Paixão da Princesa D. Isabel, popularmente conhecida como Princesa Isabel, começou cedo, logo que tomou, pela primeira vez as rédeas do governo da Monarquia, como Regente. Ela vivenciou oficialmente, o problema da escravidão, problema este que, como um espinho em seu coração, ela já sofria, desde que tomou o uso da razão. Ela sofria, mas nada podia fazer, a não ser pedir a seu Augusto Pai que alforriasse escravos ou que incentivasse o Parlamento e os Gabinetes de Ministros a produzirem leis abolicionistas. Os dois espinhos de sua coroa, que entitulamos de Paixão, foram, fora de dúvida, a escravidão e a traição com que seu Pai e toda a Família Imperial foram atingidos, pela instauração à força da República no Brasil. O problema da escravidão, ela julgou ter solucionado, pela Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, em sua terceira Regência; mas, sem querer, com esta lei ela impulsionara a derrubada de um Império tão sólido, tão próspero e tão democrata. E às escondidas do Povo em uma noite nebulosa de 16 para 17 de novembro de 1889, a Família Imperial foi exilada, no desconhecimento total do Povo e da Nação. Estes foram os dois espinhos que, da Coroa de Espinhos de N. Senhor Jesus Cristo, implantaram-se no coração da Princesa, como uma nova Rita de Cássia. Depois do sofrimento, que durante anos agüentou pela convivência com a escravidão, o segundo sofrimento, não foi tanto à instauração da república, em si mas sim, o modo como ela foi estabelecida, pela traição. Traição à Nação, traição a seu Pai, Traição à sua Família e traição também a ela, pois a República punha em derrocada o terceiro Reinado, que seria o seu para o qual ela já tinha dado provas, mais do que cabais, de competência para exercê-lo em suas Regências.
Traição à Nação, uma vez que tratou-se de um golpe militar, no qual, a não ser a cúpula de comando, os próprios soldados, não sabiam o que estava se passando. Seria uma parada? O povo conhecia menos ainda o que ocorria. Só veio a saber, o povo carioca e fluminense, dois dias depois que a Família Imperial já tinha sido exilada. Nos outros estados (na época províncias) só semanas ou meses depois. No Amazonas, só dois anos depois. Mas houve mesmo golpe militar? Havia republicanos no Brasil? Os republicanos teriam sido os autores do golpe militar? Respondendo às três perguntas, podemos afirmar que havia uma cúpula política de republicanos. Muito poucos, entretanto, pois, apesar de possuírem um Partido Republicano não conseguiam eleger, em cada legislatura, se não, dois ou três deputados. Constataram que, democraticamente, não conseguiriam nunca instaurar a república no Brasil. Apelaram para a força. Mas que força? A Marinha e o Exército eram fidelíssimos ao Imperador. Colocá-los em confronto com a Coroa, parecia impossível. Tentaram então derrubar o Gabinete de Ministros. Seria um primeiro passo para derrubar a Monarquia. Fomentaram desavenças entre os militares e principalmente do Exército e os políticos civis. Qualquer atitude do Gabinete de Ministros, em relação a militares, era o suficiente para botarem lenha na fogueira.
O Major Fulano foi mandado para a fronteira com a Bolívia? Que absurdo! Coitado do Major! Isso é perseguição dos políticos contra os militares. Algum militar não foi promovido em tempo útil? Outra afronta contra as Forças Armadas! E as brasas da fogueira crepitaram cada vez mais! Na Marinha, quase nada. A Marinha sempre foi muito fiel à Coroa. Mas no Exército, de fato, havia problemas. Os militares graduados, que tinham voltado da Guerra do Paraguai, condecorados, intitulados Barões ou Condes, queriam participar da política. O Imperador e os políticos civis, não gostavam da participação de militares na Política. Os grandes generais, da Guerra do Paraguai, como o Duque de Caxias, o Conde de Porto Alegre, o Marquês de Herval (Osório) já tinham morrido. A figura proeminente no Exército era portanto o Marechal Deodoro da Fonseca, de família empobrecida de Alagoas, que tinha sido muito ajudada pelo Imperador. Deodoro, poucos dias antes da Proclamação da república, escrevera a um sobrinho, na Bahia: “República, no Brasil, é sinônimo de desgraça completa”. Os republicanos sabiam que só ele, o homem forte do Exército, teria meios de tornar a república, algo realizável. Entretanto Deodoro se considerava amigo do Imperador. Nunca iria contra ele. Mas, contra os Ministros, talvez, sim, pois para Deodoro, depois do Brasil e do Imperador, o que mais valia, era sua farda. Algo contra sua farda, contra o Exército, da parte dos políticos, os casacas, como ele os chamava era impensável. Os republicanos sabiam disso, e aproveitaram-se. Foram tirar da cama, o pobre Marechal, febril numa crise de erisipela, para fardá-lo, e comandar uma tropa, para vingar a honra dos militares, manchada pelo Gabinete do Visconde de Ouro Preto. Ao chegarem ao Palácio, onde ser encontrava reunido o Gabinete de Ministros o Marechal e sua tropa cercou-o e, não havendo contra-ofensiva da tropa governamental (comandada por Floriano Peixoto, que se dizia monárquico, mas era republicano, ou oportunista), permitiu que Deodoro fosse enfrentar, cara a cara, o Visconde de Ouro Preto. Se Deodoro era um touro bravio, Ouro Preto era um leão de bravura. A discussão foi violenta, e não se chegou a nada, a não ser a vitória da força bruta, (como diria La Fontaine, no início de sua fábula do lobo e do cordeiro: “La raison du plus fort c’est toujours la meilleure, nous allons montrer tout à l’heure” – a razão do mais forte é sempre a melhor, nós vamos mostrar agora), pois, ao sair do Gabinete do Primeiro-Ministro, aos berros e pondo fogo pelas ventas, Deodoro determinou: “este Gabinete de Ministros está demitido e a todos estou dando ordem de prisão.” Estava derrubado o Governo, mas não o Estado. Ou seja, o Primeiro-Ministro (Presidente do Conselho de Ministros) e os demais Ministros, mas não a Coroa não a Monarquia. Tanto é verdade que, 1º: O Deodoro autorizou o Visconde de Ouro Preto (ex Primeiro Ministro) a telefonar para Petrópolis, pedindo ao Imperador que descesse ao Rio, para formar novo Gabinete de Ministros, como exigia a “praxis” da Monarquia Parlamentar, pois o país não podia ficar sem governo. O Gabinete de Ministros tinha sido derrubado inconstitucionalmente, mas o fato concreto, é que tinha sido derrubado. 2º: Os líderes republicanos não se desligavam de Deodoro, não satisfeitos com, só a derrubada do Gabinete de Ministros, e a não derrubada da Monarquia (diga-se, de passagem, que, naquela momento histórico, se o Deodoro tivesse querido, podia tê-lo feito, e já tinham até redigido um documento de Proclamação da República, a que Deodoro, peremptoriamente, recusava-se a assinar.
Derrubado o Gabinete de Ministros, o Imperador avisado pelo Visconde de Ouro Preto, (o ex Primeiro Ministro), desceu calmamente de Petrópolis, e reuniu-se com os líderes do Partido Majoritário, na tentativa de formar um novo Governo. Era o que tinha de ser feito. Depois, o Imperador chamaria Deodoro em particular, para acertar os ponteiros; Afinal, Deodoro agira, contrariando a Lei Magna de Nação. Nessa reunião do Imperador com os Parlamentares da Situação, algum deles sugeriu o nome de Silveira Martins, mas, como o Deputado gaúcho encontrava-se junto a suas bases políticas, no Rio grande do Sul, seu nome foi imediatamente alijado. Entretanto, não sabemos por que cargas d’água?, encontrava-se no ambiente, o Major Solon Ribeiro. Talvez como oficial ajudante de ordens de algum general presente. Ele era republicano “tout court” e percebeu ali a ocasião propícia de criar um incidente, que redundasse na Proclamação da República. Por que? Ele conhecia beníssimamente a rivalidade que existia entre Deodoro e Silveira Martins. Quando Deodoro servira no rio Grande do Sul, como Comandante Militar, o Presidente da Província era Silveira Martins. Tornaram-se inimigos políticos e também rivais de relações extraconjugais. Ambos eram casados, mas ambos tinham a mesma amante e esta dava preferência ao Silveira Martins. Existia ódio entre os dois. O Major Solon elaborou então, naquele momento, em sua mente doentia, uma idéia que certamente ia provocar a Proclamação da República. Esta idéia, que ele logo a pôs em prática, era de sair dali, a todo galope, provocando o brio dos militares e principalmente, do Deodoro. Seria espalhar, como um novo Calabar, o boato fatídico que atingiria, como um dardo o coração de Deodoro. O boato consistia em dizer que o Imperador dera ordem de prisão ao Deodoro e que nomeara o Silveira Martins para Presidente do Conselho de Ministros. Quando este boato chegou à casa de Deodoro, como uma granada, explodiu. Deodoro julgando que o Imperador fizera aquilo, especialmente para feri-lo, arrancou das mãos dos republicanos, a Proclamação da República, e com ódio nos olhos, disse: “Dê-me cá esse papel” – e assinou-o. Estava proclamada a república do Brasil! – Quando a verdadeira notícia chegou, de que não havia nenhuma ordem de prisão contra Deodoro, e que o Presidente do Conselho nomeado tinha sido o Conselheiro Saraiva, Deodoro caiu em depressão, e declarou ao oficial que tinha trazido a verdadeira notícia: “Tarde de mais!” Por que tarde de mais? Comparo a posição de Deodoro, nestas circunstâncias, com o Patriarca Isaac, do Povo Hebreu, que, enganado, concedera a Benção Taumaturgica antes da morte, ao filho Jacob, em lugar de dá-la ao primogênito Esaú. Quando soube da verdade, por que Isaac não voltou atrás? Não podia, a Benção era uma só. Por que Deodoro não voltou atrás? Porque também não podia; ele, na frente de todo o grupo de republicanos históricos, dera, por escrito, naquele papel, a sua palavra final. De rancor contra o Major Sólon, ordenou que fosse ele, o encarregado de dar a notícia ao Imperador (todo este assunto, encontra-se, também mais bem pormenorizado, no Livro “Diálogos Monárquicos”, de minha autoria).
Uma mulher tinha sido o “pivô”, que impedira o Reinado de outra mulher, a Imperatriz do Brasil D. Isabel I. O Brasil já tivera três Imperatrizes D. Leopoldina de Áustria e D. Amélia de Leuchtemberg, consortes de D. Pedro I e D. Thereza Christina de Bourbon das Duas-Sicílias, consorte de D. Pedro II. Com D. Isabel I, entretanto, o Brasil teria, forçando a língua portuguesa, não uma Imperatriz, mas uma “Imperadora”, não a esposa de um Imperador, mas ela mesma a Chefe de Estado, assim como sua contemporânea a Rainha Vitória da Inglaterra, ou sua antepassada, a grande Maria Thereza de Áustria Imperatriz (Imperadora) do Sacro-Império-Romano-Alemão e “Rei da Hungria”. Ou como a atual fantástica soberana da Inglaterra Elizabeth II. Essa foi a Paixão de D. Isabel.
Retirada para o exílio junto com seus pais, teve início sua morte, que foi lenta. Primeiro com a perda de sua Mãe D. Thereza Christina, um mês apenas depois da Proclamação da República, no Porto, em Portugal. Dois anos depois, com a morte de seu Pai, D. Pedro II, em Paris, a cinco de Dezembro de 1891. Em seguida, com a renúncia de seus direitos, ao trono do Brasil de seu primogênito D. Pedro de Alcântara. Mais tarde em 1919, com o acidente aéreo que tirou a vida de seu 3º filho o Príncipe D. Antônio (que nunca se casou), seguido da morte de seu herdeiro presuntivo, o 2º filho, Príncipe D. Luiz (pai de D. Pedro Henrique, neto de D. Isabel, que a sucedeu), em 1920.
Seu espírito e seu corpo não agüentaram tantas agruras e ela veio a falecer em 1922, no ano que o Governo da República suspendera a Lei que bania a Família Imperial do território nacional. Morreu santamente, era católica piedosíssima e embora não tenha ainda sido canonizada, em caracter particular podemos rezar a ela “Sancte Isabele” “Ora pro nobis”.
Fim.

Otto de Alencar Sá Pereira

Um comentário:

Tânia Marinho disse...

Meu Mestre Otto! Saber que o Senhor não se encontra mais entre nós, é um desalento..Descanse em paz, meu eterno Mestre!!!